Quando a Santíssima Virgem vivia ainda na terra, já não podia ver algum
necessitado sem socorrê-lo. Quanto mais misericordiosa não será agora que está
no céu, de onde melhor vê as nossas misérias e nos ama com coração de Mãe! Não
nos descuidemos, portanto, de recorrer a uma Mãe tão boa em todas as nossas
necessidades e de pôr nela toda a nossa esperança. Mas, ao mesmo tempo,
deixemos de lhe amargurar o coração pela nossa tibieza e pelos nossos pecados.
I. Considera que Maria é uma advogada tão piedosa, que não só ajuda ao
que a ela recorre, mas ela mesma vai à procura dos miseráveis para os defender
e salvar. Eis como ela convida a todos, animando-nos a esperarmos todos os
bens, se a ela recorrermos: “Passai-vos a mim todos e enchei-vos dos meus
frutos.” – “O demônio”, diz São Pedro, “vai sempre ao redor de nós, buscando
quem possa tragar”; mas nossa divina Mãe, acrescenta Bernardino de Bustis, vai
sempre ao redor de nós buscando a quem possa salvar: Circuit, quaerens quem salvet. Maria é Mãe de misericórdia porque a
piedade que tem de nós faz que de nós se compadeça e procure sempre salvar-nos;
assim com uma mãe não pode ver seus filhos em perigo de se perderem e deixar de
os ajudar. E quem, depois de Jesus Cristo, pergunta São Germano, interessa-se
mais pela nossa salvação do que vós, ó Mãe de misericórdia? – Ela certamente
nos ajudará quando a invocarmos e nunca jamais foi alguém por ela desamparado.
Isso, porém, não basta a seu Coração piedoso. Como diz Ricardo de São Victor,
ela previne as nossas súplicas e procura ajudar-nos antes que nós a invoquemos.
Apenas vê alguma miséria, socorre logo e não pode ver algum necessitado sem o
ajudar. A Santíssima Virgem assim praticava desde a sua vida terrestre, como
sabemos pelo fato sucedido nas bodas de Caná na Galileia. Vindo a faltar o
vinho, ela não esperou até ser rogada; mas, compadecendo-se da aflição e do
pejo daqueles esposos, pediu ao Filho que os consolasse dizendo: Vinum non habent (1) – “Eles não têm
vinho”; e obteve que seu Filho, por um milagre, convertesse a água em vinho.
Pois bem, diz São Boaventura, se foi tão grande a piedade de Maria para com
todos quando estava ainda em terra, muito maior sem dúvida será a sua piedade
para nos socorrer, agora que está no céu, onde conhece melhor as nossas misérias
e mais de nós se compadece.
II. Ah! Não nos descuidemos jamais de recorrer à nossa divina Mãe em
todas as nossas necessidades, pois que sempre será achada com as mãos repletas
de misericórdia; sempre disposta a ajudar ao que a invoque, e tão desejosa de nos
fazer bem e de nos ver salvos, que ela mais deseja conceder-nos graças do que
nós desejemos recebê-las. São Boaventura chega a dizer que a Bem-aventurada
Virgem se julga ofendida não só pelos que a injuriam positivamente, mas também
por aqueles que lhe não pedem graças. Recorramos, pois, sempre a esta Mãe de
misericórdia e digamos-lhe o que dizia o mesmo Santo: In te, Domina, speravi, non confundar in aeternum – “Em vós,
Senhora, esperei, não permitais que eu seja confundido para sempre”. Mas ao
mesmo tempo deixemos de lhe amargurar o Coração pela nossa tibieza e pelos
nossos pecados.
Ó Rainha do céu, Maria Santíssima, eu, que era outrora escravo do
demônio, consagro-me agora e sempre a vosso serviço e ofereço-me a vós, para
vos honrar e servir pelo restante da minha vida. Recebei-me, então para vosso
servo, e não me rejeiteis como o merecera. Ó minha Mãe, em vós hei posto todas
as minhas esperanças. Eu bendigo e agradeço a Deus, que por sua misericórdia me
deu esta confiança em vós. Verdade é que, no passado, caí desgraçadamente no
pecado; mas tenho confiança de haver obtido perdão pelos merecimentos de Jesus
e vossas orações. Entretanto, isto não basta, ó minha Mãe; um pensamento me
aflige: posso de novo perder a graça de Deus. Os perigos são contínuos, os
inimigos não dormem, novas tentações virão assaltar-me. Ah! Soberana minha,
protegei-me, socorrei-me nos assaltos do inferno, e não permitais me aconteça
ainda no futuro cometer pecado e ofender a vosso divino Filho Jesus. Não, não
perca eu de novo a minha alma, o paraíso e Deus. Peço-vos esta graça, ó Maria,
não me a recuseis, antes alcançai-m’a pela vossa intercessão. Assim espero.
(Por
Santo Afonso Maria de Ligório)
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