Muitas
vezes pode parecer difícil acreditar na grande misericórdia de Deus. Por um
lado, percebemos a nossa grande miséria, nossas fragilidades e nossos pecados.
Por outro, está a experiência de que Deus continua apostando por nós, pela
nossa conversão, fazendo de tudo para que entremos em nós mesmos e voltemos
correndo ao abraço do Pai, como na parábola do filho pródigo.
E
se chegamos a aceitar que Deus é realmente tão bom, ainda assim pode resistir
em nós a sensação de que somos tão pecadores a ponto de não merecer tanta
misericórdia. Em outras palavras, até aceitamos que Deus nos perdoa, mas nós
mesmos temos dificuldade de nos perdoar realmente.
Precisamos
levar a sério essa experiência, porque ela pode esconder algo prejudicial para
nossa saúde espiritual, algo inclusive que pode, em última análise, afastar-nos
do amor de Deus. Esse algo é uma espécie de soberba da nossa parte. Não é
aquele orgulho ou prepotência com a qual estamos acostumados, daquele que se
afirma em suas ideias ou de quem se coloca por cima dos outros achando-se
melhor que todos. É uma soberba mais sutil, mas que se olhamos com cuidado,
perceberemos que ela realmente tem muito em comum com esse tipo, digamos, mais
“comum”.
Nós
a reconhecemos da seguinte maneira: quando falamos que embora Deus nos perdoe,
nós não somos capazes de nos perdoar, estamos, no fundo, falando que o nosso
pecado é mais forte que o amor de Deus. Tiramos do Senhor a sua onipotência e
nos colocamos como mais fortes que Ele mesmo. E isso simplesmente não é
verdade. Por mais que possamos optar pelo mal e causar danos reais, nunca
chegaremos à altura do poder do amor misericordioso do Senhor. Por isso
podemos, e de certa maneira devemos, aceitar que por pior que seja o mal
cometido, maior ainda é o perdão de Deus. São Paulo disse que onde abundou o
pecado, sobreabundou a Graça. Do pior dos males, Deus pode tirar o melhor dos
bens.
Quando
falamos que embora Deus nos perdoe, nós não somos capazes de nos perdoar,
estamos, no fundo, falando que o nosso pecado é mais forte que o amor de Deus.
Frágeis
como somos, desde o pecado original, tendemos a desconfiar de Deus. Não só de
sua bondade, da sua onipotência ou de sua existência, mas também da sua
misericórdia. E quando duvidamos da misericórdia, de sua capacidade de perdoar,
o único caminho é o desespero. Tirando Deus do centro da realidade e
colocando-nos em seu lugar, perceberemos que não temos a força necessária para
perdoar tantas atrocidades que cometem os homens e que cometemos cada um de nós
em particular.
É
uma experiência difícil essa de não conseguir se perdoar porque ela mistura
essa soberba sutil com algo de verdadeiro.
A
parcela de verdade é que nós realmente somos incapazes de perdoar nossos
pecados. Lembremos daquela passagem que Jesus questiona os fariseus ao perdoar
pecados: “Quem é este homem que blasfema contra Deus desta maneira? Ninguém
pode perdoar pecados; só Deus tem esse poder” (Lc 5,18-26). Mas isso não pode
desesperar-nos, justamente porque Deus saiu ao nosso encontro para perdoar
todos os verdadeiros pecados que cometemos.
São
João Maria Vianney, sacerdote francês, passava horas e horas no confessionário,
levando essa misericórdia infinita de Deus aos fiéis, e falava: O Bom Deus sabe
tudo. Ainda antes que vos confesseis, já sabe que voltareis a pecar e, contudo,
perdoa-vos. Como é grande o Amor do nosso Deus, que chega a esquecer
voluntariamente o futuro, para nos perdoar. Precisamos renovar sempre a nossa
esperança e a nossa confiança nesse amor perseverante de Deus. Se essa
confiança começa a fraquejar, todo o resto do edifício da vida cristã não
tardará em cair também.
Quando
estamos com dificuldade de nos perdoar, perguntemo-nos justamente por essa
confiança em Deus, em sua misericórdia infinita. A saída parece ser deixar de
olhar para as nossas fragilidades e fraquezas, porque nelas não encontraremos
forças para o perdão, e voltar o olhar ao Senhor, pedir que Ele mesmo renove em
nós a certeza do poder de sua misericórdia. Não corramos o risco de colocar-nos
acima de Deus, de confiar mais no poder dos nossos pecados que no poder do Amor
de Deus.
(via
Jovens de Maria)
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